Paulo Rosa

O Brasil, a antítese

Por Paulo Rosa
Sociedade Científica Sigmund Freud, Caps Porto, Ambulatório Saúde Mental, Telemedicina PM Pelotas, Hospital Espírita
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Oito dias depois do famigerado 8 de janeiro de 2023 - com o ostensivo e tanático “espetáculo”, promovido pela horda primitiva convocada em Brasília - Pelotas dá o troco, sendo palco do décimo primeiro Festival Internacional Sesc de Música, de 16 a 27 de janeiro. Uma antítese. Se no Planalto transcorreu com destruição, com aniquilamento, com ruína, com demolição de símbolos, com a grotesca esperança de que o processo ganhasse corpo país afora, i.e., virasse golpe de Estado, em Pelotas, ao contrário, com o espectro da música, dos povos múltiplos, das vozes de todos, sob o clima que somente a arte proporciona, podemos celebrar o florescimento, a construção, o diálogo.

Na última terça-feira, 17, com o Theatro Guarany lotado, houve um espetáculo incomum, a apresentação da Orquestra Mundana Refugi. Deu no Diário Popular: “Projeto idealizado nos anos 90, em São Paulo, passou a contar com imigrantes e refugiados em 2017 e hoje reúne 23 integrantes de 12 nacionalidades”. Disse o maestro Carlinhos Antunes: “Queríamos movimentar a cena dos refugiados e imigrantes não só porque é uma temática importante do ponto de vista sócio-político, mas também porque é uma riqueza cultural e musical, que está, muitas vezes, isolada”. Hoje a orquestra conta com gente da França, Congo, Venezuela, Irã e Palestina, além dos brasileiros. A perspectiva de inclusão de pessoas, de intercâmbio de culturas, de tratar gente como gente está bem distante da cartilha do grande ignaro do Norte que, ante o interesse dos mexicanos por viver nos EUA, recomendou que se consolidasse um muro inexpugnável entre países vizinhos, acreditando que isso seja uma “medida”, ante a complexa questão migratória.

Se tivesse eu filhos pequenos no momento, me surpreendi pensando o que poderia mostrar para eles sobre o que se passa atualmente no mundo, de modo a que fossem ganhando compreensão do viver. A estupidez do “Capitólio americano” e a do “nacional” eles precisariam também conhecer, mas a ênfase estaria posta no Festival de Música em Pelotas, e toda sua perspectiva de amadurecimento, de busca de intercâmbio, de penetração na arte e seus desfechos humanos. As crianças precisam preparar-se para o céu e o inferno da vida, para que ganhem autonomia no pensar, decidindo sua vida por si próprias. Amarão, espero, a democracia, o sistema mais próximo da liberdade.

“A música vai sobrevoar o Laranjal”, anunciou Vitor Ramil para o concerto de sábado, sob a regência do maestro Evandro Matté, com entrada livre, na praia livre. Não só Joquim, o apelido, na verdade Joaquim da Costa Fonseca Filho, precursor-construtor local de aviões, construiu o aeroplano “Cidade de Pelotas”, voou e ainda voa sobre nosso Mar de Dentro. Vitor Ramil também voa. Nossos filhos, netos e bisnetos podem beber dessa arte. Sem contraindicações. Ilimitado. ​

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